
Contexto e Relevância do Tema
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) frequentemente se depara com questões intrincadas referentes à partilha de bens imóveis situados no Brasil, quando tais decisões são emitidas por tribunais estrangeiros. Esse cenário revela a complexidade das disputas patrimoniais internacionais e a necessidade de um entendimento profundo das normas que regem a competência e a soberania do direito brasileiro.
A análise das jurisprudências recentes do STJ sobre o tema destaca tanto a rigidez quanto a flexibilidade do tribunal ao lidar com a homologação de sentenças estrangeiras, dependendo se a partilha foi consensual ou litigiosa. Neste artigo, exploraremos essas nuances jurídicas e as implicações das decisões do STJ, proporcionando uma compreensão clara dos critérios e procedimentos necessários para a validação dessas sentenças no Brasil.
As recentes jurisprudências do STJ mostram uma abordagem variada e detalhada sobre esse tema, especialmente no que se refere ao artigo 23, III, do Código de Processo Civil (CPC).
Competência Exclusiva da Justiça Brasileira
A legislação brasileira é enfática ao definir que a justiça nacional tem competência exclusiva para julgar a partilha de bens situados no Brasil. O artigo 23, III, do CPC estabelece:
- "Art. 23. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra: (...) III - em divórcio, separação judicial ou dissolução de união estável, proceder à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o titular seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional."
Essa norma assegura que as questões patrimoniais que envolvem bens localizados no Brasil sejam decididas conforme as leis brasileiras, protegendo a soberania nacional e a ordem pública. A exclusividade da justiça brasileira é essencial para prevenir conflitos de jurisdição e garantir que as decisões sejam tomadas dentro dos parâmetros legais do país.
Abertura para a Homologação de Sentenças Estrangeiras Consensuais
Apesar da regra de competência exclusiva, o STJ tem mostrado flexibilidade em casos de partilha consensual. Em um caso relevante, o tribunal homologou uma sentença estrangeira de divórcio que incluía a partilha de um imóvel no Brasil, uma vez que essa decisão homologou um acordo entre as partes.
Jurisprudência Importante
- SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. DIVÓRCIO. PARTILHA DE BENS. IMÓVEL SITUADO NO BRASIL. ACORDO ENTRE OS EX-CÔNJUGES HOMOLOGADO NO EXTERIOR. REQUISITOS PARA HOMOLOGAÇÃO DA SENTENÇA ESTRANGEIRA. PREENCHIMENTO.
É devida a homologação da sentença estrangeira de divórcio, porquanto foram atendidos os requisitos previstos no art. 15 da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro e nos arts. 216-A a 216-N do RISTJ, bem como constatada a ausência de ofensa à soberania nacional, à ordem pública e à dignidade da pessoa humana (LINDB, art. 17; RISTJ, art. 216-F). 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não obstante o disposto no art. 89, I, do CPC e no art. 12, § 1º, da LINDB, autoriza a homologação de sentença estrangeira que, decretando o divórcio, convalida acordo celebrado pelos ex-cônjuges quanto à partilha de bens imóveis situados no Brasil, que não viole as regras de direito interno brasileiro. 3. Defere-se o pedido de homologação da sentença estrangeira.
(STJ - SEC: 8106 EX 2014/0031201-4, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 03/06/2015, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 04/08/2015)
Essa decisão demonstra que, ao validar acordos estrangeiros, o STJ respeita a vontade das partes, desde que sejam atendidos os requisitos legais brasileiros e que não haja ofensa à soberania, à ordem pública ou à dignidade da pessoa humana.
Requisitos para Homologação de Sentenças Estrangeiras
Para que uma sentença estrangeira seja homologada no Brasil, é necessário que sejam cumpridos vários requisitos formais e substanciais conforme a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) e o Regimento Interno do STJ (RISTJ).
Requisitos Essenciais
- Documentação Completa e Traduzida: A petição inicial deve incluir o original ou cópia autenticada da decisão, bem como documentos traduzidos por tradutor oficial ou juramentado no Brasil.
- Apostilamento de Haia: Documentos emitidos pela justiça estrangeira devem ser autenticados pela Apostila de Haia.
- Autoridade Competente: A decisão deve ter sido proferida por uma autoridade competente no país de origem.
- Regularidade Processual: As partes devem ter sido regularmente citadas ou deve haver comprovação legal de revelia.
- Trânsito em Julgado: A sentença deve ter transitado em julgado no país de origem.
- Respeito à Soberania e Ordem Pública: A decisão não pode ofender a soberania nacional, a dignidade da pessoa humana ou a ordem pública brasileira.
Esses critérios garantem que as sentenças estrangeiras estejam em conformidade com os princípios e normas do direito brasileiro, assegurando a proteção dos direitos das partes envolvidas e a integridade do sistema jurídico nacional.
Rigidez em Casos de Litígio
Em situações de partilha litigiosa decididas por tribunais estrangeiros, o STJ adota uma postura rígida, reafirmando a competência exclusiva da justiça brasileira. Em um caso emblemático, o tribunal negou a homologação de uma sentença estrangeira que determinava a partilha de bens imóveis no Brasil em contexto de litígio.
Jurisprudência Relevante
- DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO. PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. PARTILHA DE BENS DECRETADA PELA JUSTIÇA DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. ARTS. 15 E 17 DA LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO. ARTS. 216-C, 216-D E 216-F DO RISTJ. PEDIDO DE HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA DEFERIDO PARCIALMENTE.
A homologação de sentenças estrangeiras pelo Poder Judiciário possui previsão na Constituição Federal de 1988 e, desde 2004, está outorgada ao Superior Tribunal de Justiça, que a realize com atenção aos ditames do art. 15 do Decreto-Lei n. 4.657/1942 (LINDB) e do art. 216-A e seguintes do RISTJ. 2. Nos termos dos arts. 15 e 17 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro e dos arts 216-C, 216-D e 216-F do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, que, atualmente, disciplinam o procedimento de homologação de sentença estrangeira, constituem requisitos indispensáveis ao deferimento da homologação, os seguintes: (i) instrução da petição inicial com o original ou cópia autenticada da decisão homologanda e de outros documentos indispensáveis, devidamente traduzidos por tradutor oficial ou juramentado no Brasil e chancelados pela autoridade consular brasileira; (ii) haver sido a sentença proferida por autoridade competente; (iii) terem as partes sido regularmente citadas ou haver-se legalmente verificado a revelia; (iv) ter a sentença transitado em julgado; e (v) não ofender "a soberania, a dignidade da pessoa humana e/ou ordem pública". 3. No caso, a partilha de bens imóveis situados no Brasil, em decorrência de divórcio ou separação judicial, é competência exclusiva da Justiça brasileira, nos termos do art. 23, III, do Código de Processo Civil. Nada obstante, a jurisprudência pátria admite que a Justiça estrangeira ratifique acordos firmados pelas partes, independente do imóvel localizar-se em território brasileiro. Contudo, tal entendimento não pode se aplicar à situação em exame, em que não houve acordo, inclusive porque o réu, devidamente citado, não compareceu ao processo estrangeiro. 4. Assim, a partilha decretada no estrangeiro é válida tão somente em relação ao imóvel adquirido no Brasil em data anterior ao casamento, não havendo como homologar a partilha do imóvel cuja aquisição se deu já na constância do casamento e nem, tampouco, cabe discutir a partilha dos bens situados no estrangeiro. 5. Pedido de homologação de sentença estrangeira deferido parcialmente.
(STJ - SEC: 15639 EX 2016/0109324-1, Relator: Ministro OG FERNANDES, Data de Julgamento: 04/10/2017, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 09/10/2017)"
Neste exemplo, o STJ reafirmou que a justiça brasileira tem competência exclusiva para decidir sobre a partilha de bens situados no Brasil em contextos de litígio, protegendo assim a soberania nacional e garantindo que as decisões sejam tomadas conforme as normas brasileiras.
Conclusão
A jurisprudência do STJ sobre a partilha de bens situados no Brasil em casos de divórcio no exterior demonstra um equilíbrio entre a proteção da soberania nacional e a necessidade de cooperação internacional. Enquanto a regra geral estabelece a competência exclusiva da justiça brasileira, há abertura para homologar acordos estrangeiros em partilhas consensuais que respeitem as leis brasileiras. Contudo, em casos de litígio, a postura do STJ é rigorosa, assegurando que tais disputas sejam resolvidas exclusivamente pela justiça brasileira.
Este equilíbrio é essencial para garantir que as decisões sejam tomadas de acordo com os princípios e normas do direito brasileiro, protegendo tanto a soberania nacional quanto os direitos das partes envolvidas. Assim, o Brasil preserva a ordem pública e a dignidade da pessoa humana, promovendo uma justiça segura e equitativa.
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